SOB O SILÊNCIO DAS MANGUEIRAS

Sob o Silêncio das Mangueiras é o mais novo livro do escritor izabelense por opção, e meu amigo, logicamente, João Bosco Maia.

Para mim que já li todos os livros do Bosco, que chega ao oitavo, se não me trai a memória, é uma obra de confirmação do estilo, do engenho e da arte deste grande escritor.

O estilo do Bosco é universal, sua mensagem é universal, a narrativa poderia se passar em qualquer lugar do mundo, acontecer em Belém, na área da Cidade Velha, é só um acaso determinado pela aproximação do escritor com esta realidade, só isso. É uma história que poderia muito bem acontecer em Paris, Madri, principalmente em Roma, entrementes acontece em Belém.

Chamo a atenção para isso, porque mesmo sendo em Belém, com toda sua cultura muito bem retratada, não é e está longe de ser uma obra regional, o crítico que disser que a obra do Bosco é uma obra como a de Paes Loureiro (que no dizer do professor e filósofo Pedro Eduardo tem as palavras mergulhadas nos igarapés amazônicos e nadam junto aos botos) está redondamente enganado. Volto a afirmar, a obra de João Bosco Maia é universalista, se traz a cultura paraense em seu bojo, é consequência da ambientalização espacial do enredo, apenas isso.

Assim são todos os livros do Bosco, Olhai por Nós é um bom exemplo disso, o espaço é Moema em Santa Izabel, nem por isso é uma obra regional.

O engenho na forma de organizar o enredo é sem dúvida a principal marca das obras do Bosco. Não é possível ler um livro dele de forma desatenta, corre-se o risco de se perder o fio da meada. Ao longo da narrativa o escritor deixa várias pontas de fio soltas, que em geral vão se amarrar só no final, eu chego a pensar que por conta disso, não se extrai toda beleza da obra do Bosco em uma só leitura. Quem lê os livros dele pensando que o novelo está todo bem enroladinho sem pontas soltas corre o risco de não entender a história.

Em Sob o Silêncio das Mangueiras o Bosco chegou à excelência. O enredo apresenta dois núcleos dramáticos, um a feira do Ver-o-Peso, o outro, a moradia do arcebispo de Belém, são histórias distintas que correm distintamente ao longo de todo o texto, cheguei a me angustiar com aquilo, ficava pensando em que momento as células narrativas iriam se cruzar no enredo. Isso acontece de forma magistral no desfecho inesperado da obra. É uma narrativa que evolui sem muita pretensão de chegar a lugar algum, cheguei a pensar que não tinha nada a ver uma célula dramática com a outra. A forma como o Bosco resolve isso é uma louvação ao engenho humano, e por conhecer o Bosco pessoalmente, digo que só aquela mente para conseguir elaborar e coordenar harmonicamente tanta criatividade que dá a impressão de transbordar do livro.

Um outro bom exemplo do engenho narrativo do Bosco é o apelido dado aos personagens, os que estão na célula dramática do Ver-o-Peso, todos têm um apelido, quando os vi pela primeira vez tive a certeza de que em se tratando de Bosco aqueles apelidos ali não eram só um acessório trivial da obra, fruto do acaso, aqueles apelidos se integrariam ao enredo de alguma forma, avancei a leitura, prestando muita atenção para não passar batido, e não passei, explico:

*Tem um personagem cujo apelido é Sapo-que-o-boi-pisou, ele surge na narrativa no momento da explicação do porquê que todos tem um apelido. Mais adiante este personagem está à mesa de uma barraca de sopa, e é descrito despretensiosamente que ele baixa ligeiramente os óculos e exibe os olhos grandes e quase deflorados das pálpebras, provavelmente vítima de tireóide.

Assim acontece com os outros personagens também.

É uma belíssima obra de arte o novo livro do Bosco, tenho certeza de que um dia algum livro de sua vasta obra chegará a ser leitura obrigatória da UFPa, será um reconhecimento a altura de sua arte.