O NEOLOGISTA

       O mundo da política o fascinava. Nascera e crescera escutando as conversas de seu pai sobre o "processo de estagnação econômica" "o sopro inflacionário" e todos esses dialetos  do bom e velho politiquês tupiniquim.
      Sua mãe passara toda a gravidez escutando discursos políticos intermináveis e tediosos para despertar já no ventre sua vocação para a linguagem. E o pior, o resultadao foi além das expectativas: ao invés do tradicional mingal, o bebê já falava "traga-me aquela iguaria de consistência pastosa e gelatinizável".
      Mais impressionante foi o discurso na formatura da pré-escola: "Quero usar da minha magniloquência para acusar este recinto propedêutico de fugir dos parâmetros ontogenéticos e perempitórios aprioristicamente".
     Seus pais tinham um orgulho imenso de suas habilidades linguísticas, até perceberem sua astúcia na criação das palavras e sua vocação para o charlatanismo. Não era mais tempo; iria ser um bom político.
      Outro dom do neologista era sua habilidade com as mulheres. Sussurrava versos que criava de repente:
      "Espalhei flores de agapanto na terra submagmática de teus pés impúberes".
      Isso até o dia que levou uma surra daquelas, do pai de uma das garotas quando declamava:
     "Quero sugar dulçores de figo maduro de sua vulva peluginosa e provar o gosto acérrimo de sua secreção mucovaginóide".
       Na verdade era só potoca. Suas falações tediosas faziam as garotas dormirem antes de chegar no ponto.
      Enfim, chegava a hora de assumir sua vocação para a política. Havia estudado pouco, mas não precisava ser inteligente para enganar o povo. Seu pai era grande político da região, sempre altivo e orgulhoso de seu potencial para discursos eloquentes e criativos.
     Quando eleito foi proferir o discurso de posse. A bandinha tocava o hino da cidade; fogos espalhavam centelhas no céu, acompanhados de estampidos que ecoavam para todos os lados.
      Não se intimidou e falou fluentemente:
"neste dia fatídico de nossa proboscelância e hermenêutica posse, serei lacônico sobre minha visão transcedentária...tendo o prazer de ter ao meu lado essa mulher (senadora) a priori bastante rebogulativa.
     Aplausos. Cumprimentos finais.
    A senadora aproxima-se dele e pergunta baixinho:
     _Vereador, vereador! O que é uma pessoa rebogulativa?
    E ele sorrateiramente responde:
     _ É uma pessoa um tanto quanto semiconscifláutica. 


Gilberto Felinto (Escritor izabelense por opção)