Execução multimídia


oba
Barack Obama, o vice-presidente Joe Biden, a secretária de Estado, Hillary Clinton, e o secretário de Defesa, Robert Gates, acompanharam ao vivo, da Casa Branca, a operação “Geronimo”, que culminou com a execução de Osama Bin Laden: os executores portavam câmeras “wireless” e converteram a operação em um espetáculo via satélite.
Os EUA já protagonizaram muitos assassinatos de Estado, mas, todos inconfessados. Na Guerra Fria havia acordo tácito entre chefes de Estado, que aceitavam incursões não oficiais nos seus territórios para operar execuções, mas, a execução de Bin Laden estabelece um perigoso precedente no Direito Internacional: é a primeira vez que comandos estrangeiros, de forma aberta, invadem um país e cometem um ato de força sem prévia declaração de guerra.
Obama cuidou, minutos antes da execução, de telefonar ao presidente paquistanês, Asif Zardari, comunicando-o da operação: avisou-o de que aquilo não significava uma declaração de guerra. Tecnicamente a atitude de Obama não elide a característica de invasão territorial: a soberania paquistanesa foi ferida.
Pode o Departamento de Estado dos EUA alegar que a execução se fez em uma perseguição ininterrupta começada há 11 anos, mas, mesmo a flagrância não autorizaria a atitude sem prévia permissão do governo do Paquistão.
Alguns, e até todos, podem alegar que o fim colimado (matar Bin Laden), justificou o meio atravessado (ignorar regra explícita de Direito Internacional). Esta vertente, todavia, abre um precedente pior ainda: autoriza o princípio da vingança estatal, o que voltaria uma nação de princípios democráticos estribados desde a sua fundação (os EUA inventaram a República moderna), à barbárie da autotutela, onde o princípio mais sagrado da aplicação da Justiça, o devido processo legal, teria sido solenemente ignorado.
Sempre fui, e continuo sendo, um admirador e defensor da democracia norte-americana. Sempre fui, e continuarei sendo, um árduo adversário de medidas terroristas. Sei que as argumentações aqui cometidas não fazem sentido algum aos parentes das três mil vidas ceifadas naquele fatídico setembro de 2001.
Osama Bin Laden está morto. Tenho convicção de que um julgamento terminaria com a sua condenação à morte e ele não mereceria pena diversa. Todavia, não tenho convicção, depois de estouradas todas as bolhas dos champanhes que restarão sorvidos pelo orgulho americano, de que o seu assassinato tenha sido a coisa certa, pelo simples fato de eu ter a convicção de que não foi a atitude mais civilizada.
Partiu uma ordem da Casa Branca para assassinar Bin Laden, da mesma forma que partiu de Bin Laden uma ordem para assassinar 3 mil pessoas em Nova Iorque. A ordem de Bin Laden ultrapassou fronteiras soberanas assim como a ordem de Obama feriu a soberania de outro país: a única diferença dos dois atos de barbárie é que o de Bin Laden, neste específico caso, produziu mais vítimas.
Mas, as razões de Estado são diferentes das pessoais. Obama pesou que prender e julgar o terrorista seria um processo no qual poderia estar no banco dos réus os próprios princípios estratégicos dos EUA. Além do mais, há eleições presidenciais no ano que vem e oferecer ao povo estadunidense o sangue de quem lhes ceifou parte do orgulho nacional pode ser um tento alentador.
Como eu sempre digo, em política não há santos, tão pouco demônios: há apenas portadores das mais nobres e das mais comezinhas paixões humanas.

Blog do Parsifal