ABORTION

Contei uma história ontem sobre minha aventura no Sul do país o que me fez lembrar de outra muito boa.

Na última noite do evento científico em que fui participar na PUC Porto Alegre, foi promovida uma festa, como sempre. O evento aconteceu em uma danceteria chamada Barba Azul, um lugar muito diferente do que eu já havia visto, bem bacana. Tinha uma boa banda de rock tocando, muita gente, uma bela festa.

A entrada custava a época R$ 13,00, era caro ao que me lembro, porém você recebia uma comanda e podia consumir o valor da entrada em bebida. Eu já estava praticamente sem dinheiro, já estava só com a grana da volta para casa, por isso paguei a entrada e tinha para consumir o valor dela e nada mais.

Ao entrar fui direto ao bar, ele ficava bem centralizado no salão de dança, em pouco recuado para trás, dentro ficavam dois bar-mans, essa foi a primeira e última vez que eu vi um bar-man profissional, daqueles que jogam garrafa para cima, sacodem, giram garrafa e copo no ar, um ficava de costa para o outro fazendo um verdadeiro espetáculo que chamava a atenção de todos, o bar estava todo arrodeado de gente. Para lá eu fui.

Peguei o manu de bebidas para observar os preços, uma cerveja long neck custava R$ 4,50, eu só podia gastar R$ 13,00, por isso descartei a cerveja, daria para tomar só três. Olhei o preço dos coqueteis, o mais barato era o ABORTION, R$ 8,00, fiz o seguinte cáculo: "Tomo uma bicha dessa para dar pressão e depois tomo uma cerveja e vou embora". O objetivo principal de eu optar por uma bebida destilada era por que daria para ficar um bom tempo só bebericando-a enquanto o tempo passava, o que não dava para fazer com cerveja.

Feita a análise socio-econômica da coisa, fiz o pedido ao bar-man:

- Eu quero essa aqui: ABORTION.

Ele disse-me com um certo sarcasmo:

- Você quer a ABORSHIAM?

- É essa mesmo!

-Você conhece essa bebida?

- Claro! Eu nunca nem tinha ouvido falar.

Já estranhei a coisa na hora do pedido, porque quando ele falou alto ABORSHIAM, as pessoas que estavam ao meu lado no bar me olharam, mas isso não me incomodou mais que o olhar que o outro bar-man lançou sobre mim com o canto do olho, entendi duas coisa dos oçlhares: A primeira, ninguém botou fé que eu tomaria a bebida, eu tinha 20 anos a época, tinha cara de menino, talvez a desconfiança fosse por isso. A segunda coisa  que percebi, é que tinha entrado em uma fria. Eu estava nas mãos do destino dali para frente.

O bar-man começou a preparar meu drink, até um tempo desse eu lembrava quais eram, o coquetel era feito com tequila e outro destilado. A quilo me agoniou, porque todo o bar parou, era um bar grande tinham pelo menos umas 30 pessoas em sua volta, mas nada me agoniava mais que o outro barmam que preparava seu drink olhando para mim, assim como as outras pessoas.

Eu estava sentado ao balcão, olhando o malabarismo do trato com o coquetel. Quando o rapaz parou e jogou toda a mistura heterogênea em um copo pequeno, aquilo me deu uma tristeza, porque com um copo daquele tamanho eu não ia passa 20 minutos bebericando, a ideia principal era essa, consumir uma bebida que se alongasse na noite, afinal assim que acabasse minha parca reserva eu iria embora.

O barmam olhou para mim e disse:

-Você está preparado?

Eu não entendi para que, mas respondi afirmativamente.

Ele disse-me finalmente:

- Eu vou acender e você toma tudo.

Em mente, eu disse-me; "Ai meu Deus, em que eu tô me metendo, ele vai acender o quê?"

O barmam colocou um canudinho de alumínio no copo e riscou o isqueiro em cima, na hora o fogo subiu uns 4 centímetros, eu meti a boca no canudo e dei só uma chupada. A cena tinha uma beleza plástica singular, a danceteria era bem escura, o fogo no meu pequeno copo chamou a atenção de mais pessoas. Havia uma certa adrenalina correndo no meu corpo, isso que conto aconteceu rápidamente, quando dei por mim estava chupando o canudo, como quem tenta chupar o sujinho que fica no copo ao fim de uma vitamina que se toma de canudinho, eu ficava chupando e não vinha mais nada, todo o conteúdo do copo foi para minha garganta na primeira lapada. Desisti do canudinho e virei o copo na boca para sorver até a última gota. Eu fiquei arrasado,  a bebida que era para durar uma parte da noite, acabou em 1 segundo.

Eu fiquei triste, porém as pessoas e os dois barmans pulavam, gritavam, batiam na minha costa, o barman que me atendia levantou as duas mãos acima da cabeça e disse para mim:

-Bate!

Eu levantei do banco e bati minhas mãos com a dele, a galera foi ao delírio, foi uma festa, era muita animação. Para ser sincero, eu nem entendia o porquê daquilo tudo, o porquê de tanta euforia. Só entendi depois, porque com a empolgação dois homens pediram da mesma bebida, nenhum dos dois conseguiu beber de uma vez como eu fiz, um deles até enguiou e quase vomita no balcão.

Estava tudo muito bom, tudo muito bem, todavia nada mudava o fato de que eu fiquei sem grana para tomar mais nada além de uma long neck, a qual tomei de uma vez também, puto e fui embora. Eu não passei 30 minutos na Barba Azul. Foi uma das piores festas em que fui, eu estava sozinho, sem conhecer ninguém e sem vontade de conhecer também. Tomei a ABORSHIAM a long neck e fui embora.

O que valeu desta noite, foi só esta história que todos os meus amigos já conhecem e é mais um dos quadros que estão pendurados nas paredes de minha memória.